Quanto custa morar em Buenos Aires

A Amanda Mormito, do Buenos Aires para Chicas, fez o que eu queria fazer mas tinha preguiça: um texto sobre o custo de vida na capital argentina. Está tudo lá.

Segundo ela, para viver bem é preciso no mínimo uns 5.000 pesos por mês (incluindo neste valor o aluguel, que é a fatia mais cara do orçamento). Para uma vida mais bacana e folgada, somar outros 2.000.

Como eu não pago aluguel, meu curso de tango é gratuito e não tenho carro (ando só de bike), consigo viver com menos.  Mas tá feia a coisa.

Deem uma olhada no texto completo, que está AQUI. 

Charme no pedal!

Buzinas com estilo!

Essa dica descobri no guia Vulevú Buenos Aires e passo adiante. É uma marca chamada Belosophy, criada por duas garotas que fazem uns acessórios super charmosos para bikes.

Buzinas, cestinhas, alforjes (aquelas malinhas para colocar na parte de trás).

Não sei nada de preços, mas certamente é mais barato do que um acessório para carros!

Tudo dança, em uma casa em mudança (Leminski)

Tchau estante laranja!!

Não tem nada no lugar aqui em casa.

Pela primeira vez, em três anos, todos os livros estão sendo retirados (e não apenas espanados) para que a estante ganhe nova cor. Por enquanto, secret! Vai depender de como ficar…

A parede da sala de jantar também já tem nova – e ousada pintura: cinza. Amei.

Deu um super trabalho, porque a parede tem mais de 4 metros de altura e estava muito feia. Aprendi com o Edu: passar massa corrida onde precisa, deixar secar, lixar, passar fixador, isolar os rodapés e partes que não serão pintadas com fita azul e só depois começar a parte boa que é ver a parede mudar completamente de astral. Podem me contratar!

Para completar, estamos sem sofá e sem cadeiras para a mesa de jantar. A mesma cadeirinha que uso para escrever arrasto pela casa quando preciso usá-la com outro fim. Fase!

Mas ontem, a partir do olhar mágico do meu arquiteto para encontrar coisas no lixo, descobrimos quatro cadeiras jogadas num depósito e vamos estofá-las para que fiquem lindaassss! Me estresso um pouco porque sempre quero para ! Mas tá quase.

Enquanto isso, me inspiro e viajo especialmente em um blog argentino de decoração, para casas de gente “normal” , que compartilho com vocês: Casa Chaucha. É para ficar horas espiando tudo.

O brasileiro DCoracao também tem muita coisa.

“Ao construir uma casa ou decorar um cômodo, as pessoas querem mostrar quem são, lembrar de si próprias e ter sempre em mente como poderiam idealmente ser. O lar, portanto, não é um refúgio apenas físico, mas também psicológico, o guardião da identidade de seus habitantes.”  A arquitetura da felicidade, de Alain de Botton

Cartas de Baires: 24 de junho, dia de visita a Gardel

Muitos argentinos, talvez cansados de esperar por soluções no plano terrestre, elevaram o cantor de tangos Carlos Gardel à categoria de santo milagreiro.

Há mais de 400 placas em seu túmulo, no Cemitério da Chacarita, o maior de Buenos Aires, com pedidos de diversas naturezas e em reconhecimento às “graças alcançadas”.

“Gracias Carlos por el favor recibido para mi sobrino”, depositou por lá um anônimo. “Carlitos, hacé crecer mi pelo”, implora Anabel em um grafiti.

Todo o dia 24 de junho, data de aniversário da morte do cantor, os fãs fazem uma peregrinação à tumba onde estão seus restos mortais. Há uma espécie de tertúlia que começa desde cedo na Rua 33, ao redor de uma estátua em tamanho natural de Gardel.

Músicos, cantores, dançarinos e “fiéis” em geral deixam flores, velas e cigarros ao mestre, e passam o dia lembrando suas canções mais famosas. A cada tango iniciado, surge uma onda de “ohhhhh”…e começa o coro.

El día que me quieras”, “Volver”, “Bandoneón arrabalero”, “Por una cabeza”. Todo mundo se emociona, conta histórias, dança, se abraça. Um acontecimento.

Às 3h10, hora da morte do cantor, há um minuto de silencio. Depois, a movimentação continua, até o final da tarde.

Embora o cemitério da Recoleta seja o mais famoso da cidade e reúna as famílias mais poderosas, prefiro o da Chacarita porque tem mais “gente conhecida”. Todos os grandes nomes do tango terminaram lá.

No Setor 7E estão as celebridades “com estátua”: Osvaldo Pugliese no piano, Augusto Magaldi na voz e violão, e Aníbal Troilo (o Pichuco), no bandoneon. Nesta ala estão também os restos deJulio e Franciscode Caro, Carlos di Sarli, Homero Manzi e Roberto Goyeneche.

A lista de tangueiros na Chacarita é impressionante: há pelo menos 50 nomes famosos a serem visitados por amantes do gênero. Entre eles o brasileiro Alfredo Le Pera, parceiro de Gardel e um dos maiores letristas da história do 2×4.

Para quem não sabe, Gardel foi músico, compositor, intérprete e ator. Deixou 11 filmes e mais de 800 discos gravados. Sua voz é considerada, desde 2003, “patrimônio da humanidade” pelo UNESCO.

O cantor morreu em 1935, em um acidente de avião. Ele voava de Bogotá para Cali, na Colômbia, onde cantaria naquela mesma noite do dia 24 de junho. Quando recebeu a autorização para decolar, as asas do avião em que estava se chocaram com outra aeronave, resultando numa violenta explosão e um incêndio, que deixou dez mortos.

Entre eles, Gardel, identificado pela bela dentadura e por uma pulseira onde tinha gravado seu nome e endereço – Jean Jaures 735, Buenos Aires.

Com vocês, uma das melhores interpretações do clássico dos clássicos. Instrumental, claro. Porque a voz de Gardel é insubstituível!

 

Com 95 hectares, o equivalente a 40% do bairro, o Cemitério da Chacarita foi criado após o surto de febre amarela de 1871, que matou 13.500 pessoas na cidade (em apenas um só dia foram enterrados 540 corpos). O lugar tem muita história para contar e várias delas me chegaram pelas mãos de Hernán SantiagoVizzari, pesquisador dedicado aos costumes funerários, autor do blog Cementerio Chacarita e do primeiro museu funerário virtual de língua hispânica.

Texto no Noblat, AQUI. 

Geração “nimileurista”

Fiz este post quando estava na Espanha, em março passado. Como meu computador pifou no meio da viagem, não pude publicá-lo. Segue agora, mais atual do que nunca. Esta semana fecha um ano do movimento dos indignados e o desemprego por lá não para de crescer.

Em agosto de 2005, uma jovem catalã escreveu uma carta ao jornal El País, intitulada Yo soy mileurista. Ela se queixava da precariedade trabalhista de sua geração que, embora super preparada, não conseguia ganhar mais de mil euros por mês. Não poupava, não tinha casa, não tinha filhos, não tinha carro. Vivia para comer.

Pois bem, seis anos depois, ser mileurista é um luxo. Começa a surgir na rabeira da crise a geração nimileurista (nem mil euros) que vive com menos ainda. São os pobres da Europa, mas que, na atual conjuntura, ainda podem ser considerar sortudos.

O nível de desemprego chegou 24,4% no primeiro trimestre deste ano. É a maior taxa dos últimos 18 anos. Entre os jovens, o índice bate 49,9% de desempregados (dados de janeiro), atingindo especialmente os mais qualificados – 37% deles são menores de 30 anos com título universitário.

Há engenheiros vendendo seguros de porta em porta para ganhar 700 euros. E uma proliferação de “minijobs”, que custam 5 euros a hora.

Entre as conseqüências desta situação estão a fuga de cérebros (68% querem migrar), uma retração na emancipação (já que sem dinheiro voltam para a casa dos pais) e a desilusão (77% crêem que viverão piores que os pais).

O jornal El País fez uma excelente série com essa geração (que pode ser lida AQUI).

Também no blog Pepas y Pepes 3.0 há boas  entrevistas com quem se foi da Espanha em função da crise.

Os jornalistas, como sempre, estão com os piores salários e lançaram a campanha Grátis não Trabalho, para que colegas não aceitem ofertas indecentes de, por exemplo, 500 euros por mês para jornada de 8 horas.

Trico e histórias de amor

Com o projeto em Lisboa

Não tem nada a ver com Buenos Aires, mas tem a ver com tricotar, que eu adoro.

A artista plástica Ana Teixeira montou uma banca na Avenida Paulista e convidou quem passasse: “Escuto histórias de amor”.

Quem passou e não resistiu, parou e contou. Enquanto as pessoas contavam seus dramas e delírios amorosos, ela tricotava.

Ana desenvolve um trabalho reconhecido por alguns teóricos como “arte relacional”, ou seja, uma arte que toma como horizonte as interações humanas e seu contexto social, mais do que a afirmação de um espaço simbólico autônomo e privado.

A maioria das ações é ambientada na rua, em interação com um público bastante diversificado, composto tanto por frequentadores habituais de museus e galerias, quanto por transeuntes não habituados à convivência com obras de arte de qualquer espécie. Desta vez ela pensou em Penélope esperando Ulisses. Escolheu o tricô.

Ela já fez trabalhos semelhantes entre os anos de 2005 e 2010 em nove países: Alemanha, Itália, Espanha, França, Chile, Canadá, Brasil, Portugal e Dinamarca.  Uma câmera, ao longe, registrou a ação.

A reação das pessoas foi variada e em alguns lugares ninguém falou com ela. Em outros, ela escutou diversas histórias diferentes.

As ações foram registradas em mídia digital e uma vídeo-instalação com os filmes de seis países foi exibida em Toronto, no Canadá, em junho de 2008, no Mercer Union, Centre for Contemporary Art.

Os filmes não têm som e a vídeo instalação conta com um som único, editado com vozes em diferentes línguas e outros ruídos cotidianos dos espaços públicos.

As histórias de amor não podem ser ouvidas. Ficam guardadas no barulho das ruas e na trama do tricô vermelho.

Nova bibliografia sobre Malvinas

O conflito das Malvinas foi um dos booms editoriais da Feira do Livro de Buenos Aires neste ano em que se lembra o 30º aniversário da guerra entre Argentina e o Reino Unido pela soberania das ilhas.

Deixo abaixo uma lista de títulos (entre livros novos e reedições).

Se o dinheiro der para comprar apenas um, minha aposta fica entre Lágrimas de hielo e o livro Montoneros o la ballena blanca”, do pesquisador Federico Lorenz, que aborda a guerra sob a perspectiva histórica vinculada com terrorismo de Estado numa obra de ficção. Este cara é o cara. Há muitos anos escreve sobre o tema, sendo que esta é sua primeira obra de cunho literário. Fiquei curiosa.

1. Lágrimas de hielo(NOVO), da jornalista Natasha Niebeskikwiat, traz à tona os abusos e tormentos que “não poucos” soldados sofrerem por parte de seus oficiais superiores, assunto que chegou há pouco na Corte Surprema de Justica da Argentina, para que esta determine se estes crimes foram ou não contra a humanidade.

Natasha, primeira jornalista a pisar no arquipélago do Atlantico Sul depois da guerra, afirma que há 70 oficiais e sub-oficiais imputados por abusos e até um morto pela própria tropa.

«Lo más grave —reflexiona— no eran los estacamientos, enterrarles vivos hasta el cuello o las tremendas palizas que recibieron. Lo peor era que no les daban de comer».

Os sete pilotos que participaram da operação

2. “Malvinas, los vuelos secretos“, de  Gonzalo Sánchez  (NOVO),é um livro sobre os pilotos das Aerolíneas Argentinas que voavam para a Líbia, África do Sul e Israel para conseguir armas e traze-las ao país durante a guerra. AQUI, uma entrevista com o autor e MATÉRIA feita com os pilotos e publicada no Clarín.

3. “Rabinos de Malvinas” (NOVO) – Nesta obra, Hernán Dobry traz à tona a história de cinco religiosos que foram enviados às ilhas como apoio espiritual aos soldados judios.  Foi a primeira vez na história do país que sacerdotes de outra fé que não a católica formaram parte das Forcas Armadas. Eles tem um próprio blog sobre o tema.

4. “Guerra de Malvinas: imágenes de una tragedia”, de Román Lejtman, promete abordar “o papel da CIA; os satélites da União Soviética e a influencia de Fidel Castro e Augusto Pinochet no conflito bélico”

5. “Vidas marcadas, nuevas crónicas sobre Malvinas”,  de Agustín Gallardo, busca “recuperar a voz, o depoimento e a vivencias dos protagonistas e atores secundários don conflito”.

6. “Malvinas Operación Chaff – un secreto juego de espejos“, apresenta a visao do Brigadeiro ao Ar Ernesto Víctor Michelli sobre o conflito.

7. “Malvinas, la trama secreta”, um trabalho de pesquisa dos jornalistas Oscar Raúl Cardoso, Ricardo Kirschbaum e Eduardo Van der Kooy, publicado pela primeira vez em 1983, revisado em 1992 e reeditado agora.

8. 1982 (NOVO), do jornalista argentino Juan Bautista Yofre.

9. Vidas marcadas (NOVO), do jornalista Agustín Gallardo, que traz relatos de protagonistas que estiveram diretamente na guerra

10. Malvinas, façanha ou incompetência ou Até o último dia, do tenente-general Martín Balza e do coronel Dardo Forti, respectivamente.

11. “Trasfondo” (NOVO), de Patricia Ratto (ficção)

12. Montoneros o la ballena blanca” (NOVO), do pesquisador Federico Lorenz, aborda a guerra sob a perspectiva histórica vinculada com terrorismo de Estado. Crítica do Pàgina 12 AQUI. 

Lugares imperdíveis em Puerto Madero

Lugares imperdíveis em Puerto Madero

Foto Ohlalá

A revista Ohlalá  fez uma selecao de lugares “imperdíveis” para se visitar em Puerto Madero. Entre eles o Central Market, Petite Mason, SìSìSì e a loja Vine por Ti.

Para mim, o melhor do bairro é caminhar  ( e correr) pelos diques num final de tarde. Nunca me achei nos restaurantes. Mas aposto no Faena Arts Center, que me parece tem tudo para ser “o” lugar de arte com o passar dos anos.

Vai ficar bom Puerto Madero um dia…por enquanto o bairro ainda patina em  busca de identidade. Mas já está muito melhor do que quando cheguei, há três anos.  Isso sim.

Leiam a nota completa da revista AQUI. 

Dicas para o fim de semana em Baires

Programas grátis (ou quase) para o fim de semana

1. Sábado e domingo: Buenos Aires Market, em San Telmo.

A divulgação diz que é a primeira feira organica do bairro, o que não é verdade, porque há anos tem feirinha em Balcarce.

Mas é uma feira mais sofisticada, isso é verdade, mais aos moldes das francesas.

Cerca de 40 expositores estarão com seus produtos na Avenida Caseros, 400, entre Bolívar e Defensa (bem em frente aos restaurantes Caseros e Hierba Buena), todos com banquinhas charmosas, vendendo vinhos, queijos, produtos de granja em geral, pastas, sementes, conservas, frutas, doces, plantas aromáticas, etc.

Ideal para ir em bici, com cestinha, e depois fazer um piquenique no sol.

A lista completa dos expositores está AQUI.

Programação:

SABADO 28
10:00    Meditación
11:00    Yoga Vida Sana – Clase (Agustín Aguerrebery)
12:00    Cocina Liviana Rica y Natural (Hierbabuena)
12:45    Das Brot: panadería para chicos
13:45    Recetas de Claudio María Domínguez (Pablo Martin)
15:30    El Beneficio de la Clorofila – Weatgrass  (LuzVida)
16:15    Propiedades del Vino Orgánico – Cata (Vinecol)
17:00    10 nuevos hábitos para una nueva y mejor salud (Cocina Verde, Kara Bauer)

DOMINGO 29
10:00     Meditación
11:00     Yoga Vida Sana – Clase (Julio Cipriani)
12:30     Sustentabilidad – Una mirada particular (Organicoopers)
14:00      Raw Food – 100% Saludable (Diego Castro)
15:00
     Cómo hacer huerta orgánica en tu casa (Vivero Sonyando)
16:00     Comida orgánica – recetas simples para una vida sana (BIO Restaurante)
16:45     10 nuevos hábitos para una nueva y mejor salud (Cocina Verde)
17:00     Danzas Circulares (Diego Karp)

2. Domingo, 19h: Pedro Aznar canta Spinetta 

O cantor faz show na Plaza Itália, com a participação de Andrés Beeuwsaert e Pomo e Roxana Amed como artista convidada. O palco estará montado na avenida Sarmiento e o local terá 800 cadeiras. Neste dia a entrada na Feira do Livro também é gratuita.

3. Cinema –  Festival Stanley Kubrick, na Sala Leopoldo Lugones, Av. Corrientes 1530, Centro.

Laranja Mecânica passa na quinta, dia 3

Deixo a programação do feriado (segunda e terça nao tem nada). A lista completa de filmes, 12, está AQUI. Entrada a 15 pesos.

Viernes 27:Espartaco
(Spartacus; EE.UU., 1960)
A las 14.30 y 19.30 horas (197′; Blu-ray).

Sábado 28:Lolita
(EE.UU./Reino Unido, 1962)
A las 14.30, 18 y 21 horas (152’; Blu-ray).

Domingo 29:Doctor Insólito
A las 14.30, 17, 19.30 y 22 horas (95′; Blu-ray).

Esse é um dos trabalhos mais fortes de Travnik

4. Mostra Malvinas: Já vi esse trabalho do Juan Travnik e é realmente muito bom. Sao 63 retratos em branco e preto de ex-combatentes da Guerra das Malvinas, realizados em diversas cidades do país, entre 1994 e 2007. Completam a mostra 12 fotos de paisagens tomadas nas ilhas em maio de 2007. No CC Haroldo Conti, Av. Del Libertador 8151. Grátis.

Cartas de Baires: A existência da alma

Cartas de Baires: A existência da alma

Depois de 30 dias fora de Buenos Aires, descubro que um dos principais assuntos da cidade (além do vice de Cristina Kirchner, claro) é o preço da erva mate, que aumentou 25% na última quinzena e chegou a 30 pesos o quilo em alguns supermercados. O assunto chegou aos cadernos de economia. Inflação, oligopólio, cartel.

Para uma viciada em chimarrão como eu – duas térmicas por dia, mínimo, para recuperar as prioridades – o tema rende nota tanto quanto política. Aqui em casa tem mate cevado de manha, no finalzinho da tarde e, porque não, às vezes também de noite. Quando estou escrevendo a coluna, sempre. E quando viajo também. Cuia e bomba na mala.

Por sorte, saí do Rio Grande do Sul para morar justo em outro país “mateiro”. Uma pesquisa do Instituto de la Yerba Mate mostra que a infusão está presente em 98% das casas do país! Há máquinas de chimarrão nas rodovias argentinas semelhantes às máquinas de refrigerante, e até devotos da Virgen Gaucha del Mate. Sim, isso existe.

Mas há diferenças entre o mate argentino e o gaúcho, claro. E grandes. A primeira é a erva. Aqui é pura folha, não em pó como a nossa, e muito mais forte. Por isso, há quem tome o mate com açúcar, colocado diretamente na cuia a cada servida. Um absurdo.

Outra diferença está na cuia. A gaúcha é produzida com porongo, e melhor que seja dos grandes. Aqui eles tomam mate em qualquer lugar. Em cuias de alumínio, de vidro, de porcelana e até em copinhos. Minúsculos. Um gole “no más”.

No preparo, enquanto o argentino põe a erva na cuia inteira, nós, gaúchos, fazemos aquele montinho de lado, com espaço para a água. E outro dado para quem está chegando: na Argentina não se pode agradecer entre um mate e outro porque isto significa que não se quer mais. Gracias, só no fim mesmo.

Para aficionados, sugiro uma visita ao Museu do Mate, no Tigre. São mais de 2 mil pecas, entre cuias, bombas, recipientes para erva e chaleiras, vindos de diferentes lugares do mundo, além de livros sobre mate e instrumentos musicais feitos com porongos. Entre as raridades, a primeira térmica do mundo! Outra pedida é percorrer a Rota da Erva Mate, que atravessa Corrientes e Missiones.

Os dois lados do Rio da Prata, no entanto, coincidem em sua filosofia. O mate é para buenas (e longas) conversas e para pensar na vida.

Um dos melhores textos sobre o tema encontrei no blog “Más respeto que soy tu madre”, que virou peca de teatro.  Escrito por Hernán Casciari, conta – com muito humor – a história de uma família argentina, Los Bertotti.

Em um momento a narradora diz que a erva é a única coisa que não falta nunca na casa de um argentino. “Com inflação, com fome, com militares, com democracia, com as nossas pestes e maldições eternas. Peronistas e radicais cevam mate sem perguntar. Em verão e inverno”.

E que este é o único país do mundo em que a decisão de um menino em virar homem começa em um dia específico. “Aqui começamos a ser grande no dia que temos a necessidade de tomar uns mates sozinhos pela primeira vez. Não é casualidade. Não é porque sim. O dia em que um menino coloca a chaleira no fogo e toma seu primeiro mate só é porque descobriu que tem alma. Ou está morto de medo, ou morto de amor, ou algo: mas não é um dia qualquer”.

Perfeito.

Nota que, por acaso, saiu ontem na BBC Travel: Drinking mate in Buenos Aires 

Carta no Noblat, AQUI.